Monday 16 August 2010

Aquele Casal Emo




Na verdade, considerava-se gótico e inteiramente punk. Dois em pós adolescência sentindo vontade de chorar e espernear por sentirem-se sozinhos, morando em casas de pais e mães em estado avulso ou conjunto por conveniência, em um mundo hostil e exibindo suas caras plácidas de entojo. Andavam pela cidade, e andavam até muito, ouvindo músicas de hardcore cantadas por moças brancas, tatuadas, de cabelos pretos lisos e piercing. Achavam que tinham o motivo mais desgraçado de uma adolescência reflexo do de fora, resultado de um intercâmbio de um ano e meio na América, ou apenas fruto de uma informação contínua provida pela lan house mais próxima às suas casas. Envolvidos em cores fortes e objetos de pelúcia em formato cortante traduziam idéias ridículas que viam como 'tendência' e não necessidade por falta de qualquer senso crítico e por terem a maleabilidade esponja dos mal educados. Andavam embuídos de revolta para com os pais proletários que cortavam as regalias dentro de uma casa que não tinha o dinheiro suficiente para a família ora incompleta em pessoas ou ora imprevista em tamanho. Andavam ainda perdidos pela cidade, eventualmente escondendo a primeira garrafa de álccol que tinham em suas mochilas pretas. O casal beijava-se nas esquinas dos shoppings até que um real e talvez verdadeiramenteatualpunkexcluídomarginalsemnadaderua roubasse o celular ou o rádio mp4 de um dos amigos da sua turma e toda a tristeza do emo dobrasse por falta de uma regalia tecnológica que não seria substituída com facilidade. E tornavam-se os dois mais emocionais a cada dia, juntos, de preto, de luto. Sabiam todas as letras em inglês das músicas do momento pensando que dominavam uma língua estrangeira com fluência através de palavras ou umas frases com cinco palavras cada. Um vocabulário restrito em língua estrangeira disfarçado de fluência. Os filhos verdadeiramente emocionais e longe de serem inconformados em um estilo punk eram filhos dos que decidiram ser pais para formar uma família tradicional e falharam quiçá em seus ideais mas, de cabeça erguida, mantinham uma casa trabalhando tanto fora ou estando em uma ausência tão constante que deixavam estes outros seres carentes. Indivíduos carentes representantes de uma nova geração sem exemplo e sem noção do ridículo, sem senso de passado e controlados apenas pela eventual hora da volta para casa e para o quarto adolescente. O casal fazia pactos de sangue sem o menor conhecimento de uma hepatite C ou uma real noção de um HIV. Não sabiam o que era brasilidade mas reclamavam do estrangeiro em qualquer viagem ao estranho, ou em uma vivência com os estranhos, os distintos. Fechados em seu próprio mundo de amor cego e exclusão, o casal emo completava-se. Os dois rodavam pela cidade e as suas unhas pintadas de negro ou azul escuro nas mãos de pele de veludo buscavam agarrar quaisquer referências que sustentassem o eterno humor apático deles. Empolgavam-se juntos quando achavam um poster, um livro que traduzisse a sua 'subcultura' torta, sem mesmo entender o que os ao redor diziam, alheios ao que acontecia no mundo real e não cibernético ou estrangeiro. Andavam sem olhar para os lados, atrevessando várias ruas correndo até que um carro os atropelou na via mais rápida que encontraram socando a mais frágil para um ponto mais distante do que o maior em tamanho. Uma morte e uma paralisia corporal parcial forçaram, de repente, um pós adolescente que pensava-se triste a oscilar entre o zyprexa e a sertralina, entre a esquizofrenia e a capacidade de manter-se forte para morrer mais sábio, quem sabe. Relembrando a idiotice de um tempo fugaz, deprimido por não ter tido regras, o outrora cuidado dos pais, e agora a namorada para amar, uma ideologia para seguir e sequer gana para viver, ou continuar a viver, em uma cidade sulista qualquer, tão limitada para ele. E encontrou o verdadeiro motivo para ser emoemocional com propriedade e em idade adulta. E começou a aprender a crescer e ser independente, daí então, finalmente.